Mulher científica afetada pela desigualdade de gênero no mercado de trabalho.

Imagine um mundo em que as habilidades e talentos de cada pessoa fossem valorizados igualmente, independentemente do gênero. Parece justo, não é? No entanto, a desigualdade de gênero no mercado de trabalho é uma realidade, especialmente no universo da ciência. Desde cedo, meninas e meninos são tratados de forma distinta. Enquanto os meninos são incentivados a explorar, construir e liderar, as meninas, muitas vezes, recebem bonecas e mini-fogões como brinquedos.  

Essa divisão, aparentemente inofensiva, planta as sementes de uma desigualdade de gênero que persiste até a vida adulta e o mercado de trabalho. Na ciência, isso se reflete em uma clara disparidade. Áreas como engenharia e tecnologia são frequentemente vistas como “coisa de homem”, enquanto profissões ligadas ao cuidado, como enfermagem e pedagogia, são consideradas “femininas”. 

Essas ideias não são naturais, mas construídas pela sociedade ao longo do tempo. A ciência precisa de diversidade para prosperar, de perspectivas e experiências variadas que enriquecem descobertas e soluções; nesse sentido, é essencial eliminar da discriminação de gênero. Este texto aborda as barreiras que afetam as mulheres na ciência, desde a escolha da carreira até a progressão profissional, e como podemos construir um futuro em que o talento, e não o gênero, seja o verdadeiro critério de valorização. 

STEM: desigualdade de gênero no mercado de trabalho

O relatório “Uma equação desequilibrada: participação crescente de mulheres em STEM na ALC (América Latina e Caribe)”, publicado em 2021 pela UNESCO em parceria com o British Council, revela que as mulheres têm significativamente menos chances de ingressar ou avançar em campos de pesquisa. Globalmente, 71% dos pesquisadores universitários são homens.  

Na área de STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática - na sigla em inglês) essa disparidade é ainda mais acentuada. Apenas 3% dos prêmios Nobel de ciências foram concedidos a mulheres e, no país, a representação de mulheres brasileiras na ciência e tecnologia em cargos de liderança está entre 0% e 2%. 

As mulheres representam apenas 28,2% da força de trabalho, enquanto, em outros setores, essa participação alcança 47,3% conforme dados do Global Gender Gap Report 2024. Além disso, a Organização das Nações Unidas aponta que dobrar a participação feminina no setor de tecnologia poderia gerar um aumento de 600 bilhões de euros no PIB global até 2027. 

A resposta aos desafios 

Diante desse cenário, o British Council lançou no Brasil, em 2018, o Programa Mulheres na Ciência, com o objetivo de ampliar a representatividade feminina em STEM, evidenciando desigualdades e promovendo a diversidade. 

A estratégia do programa busca fortalecer sistemas e criar oportunidades para colaborações sólidas. Atuando como catalisador, conecta cientistas mulheres a instituições do Brasil, das Américas e do Reino Unido, fomentando o desenvolvimento individual e institucional.  

Guiado por três dimensões fundamentais ao longo de seu ciclo de vida — inspiração, desempenho e influência —, o programa tem alcançado resultados expressivos. 

  • ​​​Inspiração: incentivar meninas e jovens mulheres a explorarem carreiras científicas 
  • Desempenho: apoiar o desenvolvimento e a progressão na carreira de pesquisadoras 
  • Influência: aumentar a visibilidade e o impacto das contribuições de mulheres na ciência.  

 Parcerias e projetos

O programa atua em colaboração com governos, universidades, museus e organizações internacionais. Diana Daste, diretora de Engajamento Cultural do British Council no Brasil, reforça a visão da iniciativa: “Estamos empenhados em incentivar diferentes projetos que promovam a participação de meninas na ciência e celebrem a diversidade de culturas e identidades porque acreditamos nisso: o futuro é para todos”

Diversas iniciativas abrangentes têm sido implementadas, envolvendo desde meninas em idade escolar até cientistas em estágio avançado de desenvolvimento de habilidades de liderança e equidade de gênero. Entre os projetos de destaque, estão: 

Garotas STEM  Mulheres na ciência e inovação  Mulheres em Tech - Lideranças Inclusivas  UK-Brazil Gender Equality Partnership 
Formou professores e educadores para desafiar estereótipos e inspirar meninas a explorar disciplinas STEM, incentivando-as a seguirem carreiras na área. 97% dos participantes desenvolveram novas habilidades pedagógicas.  Ofereceu oportunidades para mulheres pesquisadoras brasileiras nas áreas STEM que desejam inovar e empreender  Desenvolveu formação para mulheres pesquisadoras, profissionais e/ou empreendedoras nas áreas STEM que desejavam avançar em suas carreiras.  Visa promover a igualdade de gênero em instituições de ensino superior e pesquisa no Brasil por meio de parcerias com instituições britânicas, associadas ao Athena Swan Charter 
Em duas edições, a iniciativa financiou 42 projetos em estados das cinco regiões do Brasil, impactando mais de 11.630 meninas em todo o país.  Fruto da parceria entre o British Council e o Museu do Amanhã, a iniciativa já realizou seis edições e impactou mais de 800 pesquisadoras brasileiras. Como resultado direto, a participação feminina na liderança de projetos de pesquisa aumentou de 33% para 42%.  Lançado em 2022, este programa formou parcerias com 13 instituições brasileiras que replicaram o projeto em 14 turmas. Um total de 635 mulheres aprimoraram suas habilidades ao longo das três fases do projeto. Em duas edições, envolveu 15 instituições do Reino Unido e 35 do Brasil, abrangendo quatro das cinco regiões do país. Um resultado concreto foi a criação do Marco Referencial para a Igualdade de Gênero em Instituições de Ensino Superior no Brasil.  
É necessário combater a desigualdade de gênero no mercado de trabalho para que mulheres como a da foto tenham mais acesso a oportunidades.

Marco referencial para a igualdade de gênero

Como parte do programa Mulheres na Ciência, o British Council impulsionou o desenvolvimento do Marco Referencial para a Igualdade de Gênero voltado a instituições de ensino superior, ciência e tecnologia no Brasil, inspirado no Athena Swan Charter do Reino Unido. O documento visa promover mudanças institucionais de longo prazo para enfrentar discriminações e transformar comportamentos no ecossistema da educação superior e da pesquisa. 

Criado no Reino Unido em 2005, o Athena Swan Charter tornou-se um marco internacional na promoção da igualdade de gênero na educação superior e na pesquisa. Originalmente concebido para incentivar e reconhecer avanços nas carreiras de mulheres na tecnologia, ciência, engenharia e matemática, o programa evoluiu para se consolidar como um modelo global de inclusão e transformação

No Brasil, o desenvolvimento do Marco Referencial envolveu 50 universidades brasileiras e britânicas, com o objetivo de atender às especificidades locais e apoiar instituições de ensino superior no enfrentamento da desigualdade de gênero em STEM.  

O processo teve um olhar especial para os desafios enfrentados por mulheres negras, indígenas, quilombolas e outras populações sub-representadas. Para garantir sua relevância, viabilidade e eficácia, foram adotadas ferramentas e metodologias cuidadosamente planejadas, alinhando-se às necessidades do ambiente acadêmico e científico brasileiro. 

O programa Mulheres na Ciência já alcançou resultados significativos em prol da equidade de gênero: 

  • Mais de 100 instituições de ensino e pesquisa participaram ativamente das iniciativas. 
  • Mais de 60 projetos foram realizados, abordando desigualdades de gênero nas áreas STEM. 
  • Mais de 1.000 mulheres receberam treinamentos em liderança, ciência e inovação. 
  • 15 projetos em colaboração entre Brasil e Reino Unido foram desenvolvidos. 

 

Grupo de Trabalho Interinstitucional: unindo forças 

Em 2023, o British Council realizou uma série de 10 workshops para disseminação e socialização do Marco Referencial em todas as regiões do Brasil, envolvendo mais de 65 instituições. Essa iniciativa foi seguida por um mapeamento que identificou ações para criar planejamentos estratégicos destinados a impulsionar a diversidade de gênero na ciência, o que poderá ser materializado por meio Grupo de Trabalho Interinstitucional para Gênero e Diversidade na Educação Superior e Ciência. 

O Grupo de Trabalho (GT) é o resultado de uma longa relação entre o Reino Unido e o Brasil. Formado por importantes instituições brasileiras, como o CNPq, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), o Conselho Nacional das Fundações Estaduais de Amparo à Pesquisa (CONFAP) e o Ministério da Educação (MEC), a articulação pretende fortalecer políticas públicas e promover a cooperação internacional em áreas estratégicas, com um foco em ações sistêmicas e processos que garantam que as mudanças sejam sustentáveis e tragam a diversidade para o centro da equação, como ressalta Diana Daste. 

O GT atua em três eixos principais: 

  • Desenvolvimento de ferramentas para sistemas de avaliação e indicadores. 

  • Alinhamento de dados e informações para documentar processos de igualdade de gênero. 

  • Fortalecimento de capacidades institucionais e comunidades de prática. 

 Prêmio Mulheres e Ciência: celebrando conquistas 

Uma das primeiras iniciativas do Grupo de Trabalho foi a criação do Prêmio Mulheres e Ciência, em 2024, com um investimento de R$500 mil para valorizar pesquisadoras e instituições de ensino superior que se destacam na implementação de ações de equidade de gênero, promovendo a diversidade e inclusão de mulheres nas carreiras de ciência, tecnologia e inovação.  

Realizado pelo CNPq, em parceria com o British Council, o Ministério das Mulheres e o Banco de Desenvolvimento da América Latina (CAF), foram definidas três categorias, sendo duas categorias individuais, uma de estímulo, para pesquisadoras de até 45 anos, e outra de trajetória para pesquisadoras com 46 anos ou mais, e uma terceira categoria de mérito institucional, que premia instituições de educação superior ou institutos de pesquisa com planos de ação estratégicos desenvolvidos para a indução de políticas de igualdade de gênero como a implementação do marco referencial. Esta última categoria tem apoio do British Council.  

As instituições que receberem esse reconhecimento serão um farol para inspirar outras”, afirma a professora Dalila Andrade Oliveira, diretora de Cooperação Institucional, Internacional e Inovação do CNPq e presidente do grupo interinstitucional. 

Construindo um futuro equitativo 

O programa Mulheres na Ciência do British Council além de transformar o presente, constrói as bases de um futuro mais justo e igualitário. Ao evidenciar pesquisas, desenvolver projetos, parcerias nacionais e internacionais diante dos desafios estruturais e culturais que impedem a plena participação das mulheres nas áreas STEM, o programa está colaborando para um mundo onde a inovação, a sustentabilidade e a inclusão são realidades para todas as pessoas. 

À medida que avançamos, é crucial continuar apoiando e ampliando iniciativas como essa. Afinal, um futuro em que a ciência é feita por todas as pessoas é mais rico em perspectivas, ideias e inovações. Se você deseja saber mais sobre o impacto dessa transformação, confira a revista Mulheres na Ciência, uma publicação do British Council!